Munido de água fria, o ministro Gilberto Carvalho
(Secretaria-Geral da Presidência) vai ao Congresso nesta quarta (15). Tentará
apagar a fogueira que a bancada evangélica acendeu para queimá-lo.
Gilbertinho, como o chamam Lula e Dilma Rousseff, pôs-se em movimento nas
pegadas de uma reunião de congressistas evangélicos. Deu-se nesta terça (14), no
gabinete do senador Magno Malta (PR-ES).
Presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Família Brasileira, Magno
escalara a tribuna do Senado, na semana passada, para pespegar em Gilbertinho
adjetivos
inamistosos: “safado”, “mentiroso”, “irresponsável”, “cara de pau”…
No encontro que ateou preocupação no ministro, Magno e seus pares decidiram
desqualificá-lo como também como interlocutor. Na Secretaria-Geral, a principal
atribuição de Gilbertinho é dialogar com sindicatos, movimentos sociais e
segmentos religiosos.
Os evangélicos não precisam de intermediários, disse Magno, traduzindo o que
vai na alma de sua turma. Havendo questões relevantes a tratar, o bloco da
Bíblia vai bater direto na porta de Dilma Rousseff, sem a usual escala na sala
de Gilbertinho.
Deve-se a aversão dos evangélicos a declarações feitas pelo ministro num
encontro com representantes de movimentos sociais, há 15 dias, em Porto Alegre.
Nessa reunião, Gilbertinho aconselhou os ativistas sociais a disputar com os
pastores a simpatia dos fiéis que emergem para a “nova classe media”.
O ministro disse coisas assim: “Lembro aqui, sem nenhum preconceito, o papel
da hegemonia das igrejas evangélicas, das seitas pentecostais, que são a grande
presença para esse público que está emergindo.” Magno e seus congêneres tomaram
o lero-lero como uma declaração de guerra.
A fogueira ganhou contornos inquisitoriais depois que Dilma converteu em
ministra-chefe da Secretaria de Políticas para Mulheres a amiga Eleonora
Menicucci, uma conhecida ativista da causa do aborto. Magno Malta e Cia. tomaram
a nomeação como uma espécie de traição.
No encontro desta terça, além de transformar Gilbertinho em ex-interlocutor,
decidiu-se encaminhar a Dilma uma nota de repúdio à escolha de Eleonora.
Evocou-se um documento assinado por Dilma na campanha de 2010.
No texto, a então candidata comprometera-se a não enviar ao Congresso
proposta de legalização do aborto. Algo que ela, de fato não fez. De resto,
Dilma anotara anotara ser “pessoalmente contra o aborto”. Os evangélicos
enxergaram na nomeação da nova ministra uma contradição.
Submetido ao cheiro de queimado, Gilbertinho tocou o telefone para João
Campos (PSDB-GO), líder da bancada evangélica na Câmara. Pediu uma audiência com
o deputado. Recebeu um “não” como resposta. Campos alegou que já tinha
compromisso para a manhã desta quarta.
O ministro insistiu. O deputado não se deu por achado. Disse que
comprometera-se com Magno Malta a participar da reunião na qual será redigida a
nota de repúdio a ser entregue a Dilma. Insistente, Gilbertinho pediu para
participar desse encontro.
Consultado, Magno Malta concordou em receber o desafeto junto com João Campos
e outros evangélicos que se disponham a ouvi-lo. Magno fez pose de magnânimo:
“Todo cristão sabe que deve perdoar, compreender e tratar o próximo como irmão.
Seja qual for o assunto, o ministro será tratado com respeito e dignidade.”
Nem todos parecem, porém, dispostos a chamar o ex-seminarista Gilbertinho de
“irmão”. Membro do grupo político do vice-presidente Michel Temer, o deputado
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um evangélico de biografia ortodoxa, recusa-se a
participar da reunião com o ministro.
Na noite desta terça, Cunha refugou a ideia de perdão no twitter: “Ele não
está mais qualificado para ser interlocutor dos evangélicos. Com todo o respeito
a quem ele vai procurar amanhã, não adiantará.” Noutra nota, escreveu: “Ele será
recebido por educação.” Numa terceira, anotou: “Eu não
vou”.
Cunha esmerou-se também nos ataques à nova titular da pasta das Mulheres. De
sua tribuna na web, repisou: Gilbertinho “não foi feliz” em suas declarações. Ao
mirar em Eleonora, aproximou o governo Dilma da atmosfera permissiva de Sodoma: “A nomeação
da abortista [para o cargo de] sodoministra foi um desastre para a
imagem do governo. Lamentável mesmo.”
É nessa fogueira de chamas altas que o ministro Gilbertinho vai borrifar água
fria. Leva as mãos aos baldes em combinação com Dilma. O Planalto receia perder
os votos evangélicos no Congresso, estimados em cerca de 50 –na Câmara, 47; no
Senado, pelo menos três. Numa entrevista da
semana passada, Gilbertinho já havia manuseado o extintor. Não resolveu. Tentará
de novo.
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