por Maria José Rosado, das Católicas pelo Direito
de Decidir
É costume dizer que no fim do ano não se deve comer peru ou
qualquer outra
ave que cisque para trás, pois significaria arriscar-se a
viver todo o
novo ano andando de marcha a ré.
Neste final de 2011,
enquanto no Uruguai, seguindo o que aconteceu no México
e na Colômbia, o
Senado aprova a descriminalização do aborto, no Brasil
vivemos o
retrocesso.
Nesses países, como também na Argentina, amplas discussões na
sociedade
apontam na direção de mudanças legais que efetivem o respeito aos
direitos
humanos das mulheres. Em nosso país, uma Medida Provisória
instrumento
herdado do autoritarismo da ditadura militar decretada em
momento oportuno
para evitar o debate e a crítica, quer tornar compulsória a
maternidade para
as mulheres brasileiras.
Nenhum artifício de retórica
poderá convencer de que a Medida não diz o que
efetivamente diz: Todas as
gestantes brasileiras estarão sob a vigilância do
Estado e das forças mais
reacionárias da sociedade para impedir que a
maternidade se realize em nosso
país de forma digna do ser humano: como
resultado de escolha e decisão
pessoal.
A MP assinada pela Presidenta implanta no Brasil a figura da
maternidade
constrangida. A criação de um cadastro nacional de gestantes
havia já sido
proposto por um ex-deputado que declarou alto e bom som seu
objetivo:
combater o aborto. Ora, o Brasil é signatário de documentos
internacionais
em que se comprometeu a respeitar os direitos das mulheres,
especialmente em
relação à sua capacidade reprodutiva.
O que lev a
então o Governo, na figura de sua mais alta representante, a
desrespeitar
suas próprias decisões políticas? Estaremos diante de uma
teocracia
disfarçada? Foram públicas e explícitas as pressões de setores
religiosos
conservadores, contrários à vida das mulheres na última campanha
eleitoral.
Será então esse cadastro nacional parte do cumprimento de
compromissos
assumidos naquele momento com tais setores?
Se assim é, repetimos a
pergunta: O que é isso, Presidenta? Nossa
Constituição, fruto de debate
democrático, estabelece respeito às religiões,
mas impede o Estado de
guiar-se por princípios que impeçam a realização das
liberdades individuais,
inclusive a de não professar qualquer crença. Não se
pode impor doutrinas e
valores particulares de grupos religiosos a toda a
sociedade. É vergonhoso
que, na América Latina, seja o Brasil o país do
retrocesso em relação à vi da
das mulheres, aos seus direitos e à
possibilidade da realização livre e
desejada da maternidade.
Maria José Rosado é presidenta ONG Católicas
pelo Direito de Decidir
http://www.viomundo.com.br/politica/maria-jose-rosado-o-que-e-isso-president
a.html
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