quinta-feira, abril 07, 2011

Valor Econômico - Educação do RJ

Troca-troca de políticas arruína ensino no Rio

Luciano Máximo

Gasto médio por aluno é 20% maior que no Nordeste, mas nota do Estado
no Ideb só perde para o Piauí

Nos últimos cinco anos, o desempenho das escolas estaduais do Rio de
Janeiro no principal indicador de qualidade do ensino do país ficou
praticamente estagnado, variando de 2,6 para 2,8, abaixo da meta de
2,9. A nota vermelha no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(Ideb) do ensino médio coloca o segundo Estado mais rico do Brasil à
frente apenas do Piauí, cujo orçamento da educação é R$ 1,2 bilhão, um
terço do gasto do Rio. A repartição de recursos do Fundo de Manutenção
da Educação Básica e de Valorização do Magistério (Fundeb) mostra
ainda que o investimento anual por estudante do ensino médio
fluminense, de R$ 2.061, é maior que a média do gasto de todos os
Estados nordestinos (R$ 1.697).

Embora mais recurso na educação seja uma reivindicação fixa e sempre
desejada, a explicação para o péssimo quadro do Rio não é dinheiro. É
política. Contínuas interrupções de projetos educacionais do Estado
são apontadas por especialistas como uma das mais fortes razões para
os problemas. Nos últimos 35 anos, cada governador mudou três vezes o
comando da educação, em média.

Entra governo, sai governo, ficaram pelo caminho a experiência do
ensino em tempo integral, de Darcy Ribeiro e Leonel Brizola
(1983-1987); o estabelecimento de um plano de carreira para o
magistério, no governo Moreira Franco (1987-1991); as terceirizações
na educação, de Marcello Alencar (1995-1999); a avaliação de
desempenho com Anthony Garotinho (1999-2002); e o Plano Estadual de
Educação, criado no primeiro mandato de Sérgio Cabral (2006-2010),
agora substituído por novas diretrizes com validade de 12 anos, cuja
coordenação está nas mãos do terceiro secretário de Educação de
Cabral, o economista Wilson Risolia. A meta do dirigente é deixar o
Rio entre os cinco melhores Estados no Ideb até 2014.

O professor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual do Rio
de Janeiro (UERJ) Gaudêncio Frigotto lembra que, a partir dos anos 70,
a educação fluminense começou a ser loteada com a entrega de
diretorias regionais de ensino a políticos. A acadêmica Lia Ciomar de
Faria, terceira secretária de Educação do governo Garotinho
complementa: É o fenômeno político conhecido por chaguismo, em alusão
ao ex-governador biônico Chagas Freitas (1979-1983). Até hoje a escola
é um balcão de negócios, com indicação de professores e diretores e
até controle de matrículas por deputados estaduais, observa Lia.

O atual secretário Risolia não confirma, mas fala em forças que jogam
contra. Tanto é que uma de suas primeiras medidas, de janeiro deste
ano, foi instituir processo seletivo para todos os cargos estratégicos
da educação, uma ação inédita no país. Dos diretores regionais
pedagógicos e administrativos ao subsecretário, abaixo de mim, todos
os profissionais serão selecionados pelo perfil pragmático, de
liderança, com traços de empreendedorismo, defende Risolia.

Na barulhenta turma de 2º ano da Escola Estadual Jornalista Tim Lopes,
no Complexo do Alemão, Lucas de Andrade, de 16 anos, também conclui
que a culpa para os problemas educacionais do Rio é dos políticos. Só
ligam para a educação na hora da eleição, durante o mandato ela é
esquecida, diz. O colega de classe Daniel da Cruz, de 17 anos, acha
que a escola não fala a língua do jovem. Para Daniela Messias, também
de 17 anos, os alunos são muito desinteressados. Já Luan Gonçalves, 17
anos, está animado com as novas amizades e a nova escola, inaugurada
este ano dentro do projeto do PAC de revitalização das comunidades do
Alemão. Vi palestras com atletas e gente importante. Isso ajuda nos
estudos, mas não rola em todos os colégios, diz Luan.

O jovem tem razão. A escola Tim Lopes é exceção. As salas de aula são
amplas, têm ar-condicionado, há laboratórios de ciência, de
informática e de atividades vocacionais e culturais, um auditório
espaçoso, vestiários para professores e até uma piscina semi-olímpica,
com salva-vidas em dois turnos. Ela está entre as cem unidades
escolares em ótimo estado, em um total de 1.457, segundo diagnóstico
de infraestrutura da rede. O recente levantamento do governo aponta
62% dos colégios em condição regular, ruim ou péssima.

Além dos problemas físicos, o sistema de ensino estadual do Rio de
Janeiro revela-se bastante debilitado internamente: 500 mil alunos nos
níveis fundamental e médio (40% do total) têm defasagem idade-série, a
taxa média de reprovação da rede chega a 22% e as matrículas estão
estagnadas há dez anos. Há registro de evasão em muitas escolas,
principalmente em unidades perto de favelas. A sindicalista Edna Felix
elaborou uma cartilha para orientar alunos e professores em casos de
violência externa e envolvendo os próprios alunos. Temos que enfrentar
tiroteios e agressões. Houve um caso de alunos que discutiram com a
direção e apedrejaram a escola.

A carência de professores na rede estadual ultrapassa a marca de 10
mil professores - o Estado conta hoje com 50,8 mil docentes, ante 79
mil em 2006. Todo ano, 4 mil trabalhadores se exoneram ou entram em
licença, estão desmotivados com o trabalho. Como alguém com nível
superior fica na rede com um salário de R$ 700?, pergunta Beatriz
Lugão, dirigente do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação
(Sepe-RJ).

O salário-base do professor no Rio é de R$ 765 para carga semanal de
16 horas. Proporcionalmente a uma carga de 40 horas, o valor está
entre os 15 melhores do país, mas não impede que o profissional faça
inúmeras horas extras e trabalhe em outras escolas, realidade de todo
o Brasil.

Para atrair quadros, o governo começou também este ano a oferecer
ajuda de R$ 50 para o transporte e de R$ 500, chamada de
vale-qualificação, além de garantir remuneração extra para
profissionais que cumprirem metas. A medida trouxe de volta à rede 200
professores desde janeiro, de acordo com a Secretaria de Educação.

São 12 mil professores cedidos para outras áreas ou em licença.
Editamos decreto que desobriga a secretaria de pagar por esse
profissional e vamos contratar uma empresa privada para rever as
licenças médicas, que têm um comportamento curioso em dez anos: as
solicitações sobem nos períodos de aula e caem durante as férias
escolares. Abrimos concurso público para 1.372 professores de
matemática e física, conta Risolia.

Pagamento extra e meritocracia são rechaçados pelo sindicato e não
tiveram consenso entre os docentes, mas são assuntos de muita reflexão
nesses três primeiros meses de validade. É uma forma de apoio ao nosso
trabalho. Tudo que vem para valorizar é benéfico, opina Cristiane
Dias, professora de português e inglês da escola estadual Caic
Theóphilo de Souza, na comunidade pacificada Nova Brasília, uma das 12
favelas do Complexo do Alemão. Já para Leon Neves, que dá aulas de
história na unidade, o salário deveria ser priorizado. A educação não
vai melhorar com agrados, vale-isso, vale-aquilo. De acordo com o
sindicato, o último aumento salarial da categoria foi de 8%, em 2008.
A entidade quer reajuste de 26%.

Para este ano, o governo sinaliza apenas as remunerações extras, que
só serão pagas no ano que vem e não vão contemplar os professores com
menos de 70% de frequência. As estatísticas indicam que não há relação
entre salário alto e desempenho escolar. O que impacta na qualidade é
o investimento elevado, acredita Risolia. Segundo ele, o Rio planeja
ampliar o orçamento do setor a partir de 2012. A ideia é destinar
entre 28% e 30% das receitas estaduais à educação. Estados com
melhores desempenho estão nessa margem.

Valor Econômico/AC

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