terça-feira, novembro 23, 2010

A dor de ser o que é

 
15/11/2010 - 22:00:00

 
ainda resta muito a saber

"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender; e, se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar."
Nelson Mandela
 
Eu hoje li um texto em que o autor se declarava favorável ao bullying, argumentando que é somente assim que se fala sobre diferenças, e que essa educação deve começar na infância, onde sofrem todos os diferentes: afeminados, gordos, magricelos, negros, branquelos, pobres, orelhudos, narigudos, estrábicos... Meus pensamentos estão confusos e eu divido com vocês minhas dúvidas, por isso digo que não sei se concordo ou não com o autor. Concordo. Não concordo.
 
Nessa semana dois episódios me chamaram a atenção. Primeiro o rapaz de 18 anos que foi preso em flagrante por beijar um adolescente de 13 num cinema, do cinema pra delegacia e de lá pro Centro de Detenção Provisória, onde vai amargar dias de muita angústia, até que alguém ache uma brecha na lei que o permita responder em liberdade pelo seu crime. Assim espero, mas não me surpreendo se for condenado à pena máxima. Que tal enforcamento em praça pública, apedrejamento, haja vista que já houve um linchamento moral?
 
Preso por beijar, e não adiantou o garoto dizer que não foi forçado a nada e que sabia o que estava fazendo. Sabia, mas não sabia. É crime, e pronto. Está na lei. Tivesse o garoto 14 anos a situação atenuaria, mas não é o caso. Embora saibamos todos que um garoto de 13 anos nos anos 80 era um garoto com menos visão de mundo que os que hoje têm 10 anos. Outros tempos, mas a lei é antiquada mesmo e não creio que alguém com puder de mudá-la tenha interesse em fazê-lo. Entram aqui os valores das senhoras católicas de Santana, por exemplo...
 
Embora ache uma enorme imprudência o que ele fez, não posso deixar de pensar que a visibilidade que conseguimos nos últimos anos tenha ajudado a confundir a cabeça desses dois, e eles por certo acharam que estavam na Avenida Paulista em dia de parada quando pode tudo... Faltou maturidade, infelizmente o mundo não aceita dois homens se beijando em público.
 
Segundo esse episódio da agressão, justamente na avenida da micareta... Hoje a tarde via casais gays de mãos dadas, juntei-me a um grupo no local da agressão e ouvi comentários diversos, inclusive que por certo os agressores teriam sido assediados... Agredir alguém com uma lâmpada fluorescente, socos e pontápes é tentativa de homicídio, mas aqui a justiça foi rápida e os agressores já estão em casa, menos de 48 horas após cometerem seus crimes. Ainda que presos em flagrante, ainda que a agressão possa ser caracterizada por tentativa de homicídio.
 
Agredir uma pessoa supostamente homossexual pode, se tiver residência fixa e pais abonados é certeza de impunidade, se não tiver também é - vide a quantidade de crimes homofóbicos que simplesmente caem no esquecimento Brasil adentro. Poderia listar alguns, mas não quero. Vocês sabem tão bem quanto eu e creio que muitos já sentiram na alma o quanto dói ser agredido por ser diferente.
 
Cada um sabe a "dor" de ser o que é.
 
Três anos atrás eu fui assaltado e agredido por ser gay, cortava caminho pela ciclovia do Horto Florestal, tradicional ponto de encontros, não dei atenção para garotos que fumavam um baseado numa das trilhas e me pediram dinheiro, não dei e tentei sair de lá rapidamente, corri e fui derrubado, apanhei um monte e cheguei a morrer... Digo que cheguei a morrer pois num instante vi do alto das árvores  o meu corpo inerte no chão e a sensação de que o deixava ali, morto. Mas algo maior me fez ficar aqui, talvez o meu amor pela Vida e pela minha família.
 
Da agressão fui direto pro hospital, fiz tomografia do crânio e raio-x de braços e costelas, tomei 20 pontos na cabeça, fiz uma plástica de emergência na sombrancelha direita, semanas para me recuperar e não me entregar ao medo de sair de casa.
 
Esse tipo de agressão a gente nunca esquece.
Infelizmente está cada dia mais banal.
E me pergunto até quando.
 
Chega?

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