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Cidades
Homossexual denuncia preconceito no trabalho
Número de queixas de discriminação aumenta na Justiça
Fábio Gallacci
Da Agência Anhanguera
gallacci@rac.
“Não queremos casalzinho homossexual dentro da empresa.” Este teria sido o recado dado pelo gerente de uma indústria em Mococa a dois funcionários, que se diziam apenas amigos, poucos dias antes de mandar um deles embora. O outro foi demitido meses depois. Durante uma reunião para discutir metas em um grande magazine em Ribeirão Preto, um dos funcionários foi chamado pejorativamente de gay pelos colegas e, ao invés de exigir respeito na sala, o gerente se limitou a rir. Situações como essas, que costumavam ser omitidas pelas vítimas por receio da exposição, têm chegado com cada vez mais frequência ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, sediado em Campinas, em ações pedindo indenizações por assédio moral.
O Ministério Público do Trabal ho (MPT) de Campinas, por sua vez, também registrou dois casos envolvendo discriminação sexual este ano. Um deles relacionado a um transexual, motorista de ambulância em Itu, está sob investigação. Um caso envolvendo um supermercado de Campinas foi arquivado recentemente por falta de provas.
Justamente a falta de provas e a dificuldade em reunir testemunhas que confirmem os fatos ainda são os principais obstáculos para combater a discriminação no trabalho. Um exemplo disso foi vivido em 2006 pela massoterapeuta Maria Aparecida Almeida, a Cida, de 30 anos, que afirma ter sido vítima de discriminação por sua orientação sexual no local onde trabalhava em Campinas.
A pressão foi tanta que ela decidiu abandonar o emprego ainda no período de experiência. “Os colegas e a chefia gostavam do meu trabalho e confiavam em mim, a ponto de me pedirem para trabalhar no caixa da loja. Quando descobriram a minha orientação sexual, o tratamento mud ou. Passei a ouvir piadinhas e provocações. Também passei a ser perseguida. Fiquei superdeprimida. Desde quando a sua orientação sexual tem relação com a competência profissional?”, lamenta ela, que há nove anos vive uma relação estável com sua companheira. Cida resolveu ir à Justiça, mas o processo foi arquivado por falta de provas.
B.F.S., de 40 anos, homossexual, soropositivo, também entrou na Justiça contra uma rede de supermercados em Campinas alegando ter sido vítima de preconceito. Durante dois anos e dois meses, ele trabalhou na cozinha do supermercado e, após dizer que tinha o vírus HIV, passou a ser alvo de piadas e acusações agressivas em forma de bilhetes deixados em seu armário. “Além de bicha, é preta e aidética”, dizia um dos bilhetes anônimos. “Me senti muito mal, deprimido mesmo”, lembra ele, que agora luta para provar o que diz.
Reação
“Antigamente, a postura de rejei� �ão ao diferente no ambiente de trabalho era mais intensa porque não havia uma reação a isso. Hoje em dia, é muito saudável que haja essa reação. É muito importante esse papel pedagógico do Direito, que diz: ‘A orientação sexual não é algo a ser considerado no mercado de trabalho porque todos valem a mesma coisa. Todos são iguais’”, ressalta a desembargadora federal do trabalho Tereza Aparecida Asta Gemignani, do TRT-15.
O juiz da 1ª Vara do Trabalho de Piracicaba, Firmino Alves Lima, autor do livro Mecanismos Anti-Discriminató
Ainda exceções, empresas dão o bom exemplo
Enquanto algumas empresas pouco fazem para acabar com o preconceito velado ou explícito contra os funcionár ios homossexuais, outras dão exemplo de que é possível aliar respeito às diferenças e bons resultados. A IBM, com uma unidade em Hortolândia, é uma delas. Para garantir que todos os segmentos tenham o direito de manifestar a sua opinião, foram criados os Comitês de Diversidade. Esses grupos desenvolvem iniciativas para integrar as pessoas e facilitar que suas demandas sejam ouvidas. Os trabalhadores da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) também incluíram em sua negociação salarial deste ano uma cláusula que determina que os funcionários que tenham companheiros do mesmo sexo possam estender a eles seus benefícios, como o convênio médico. O acordo, em fase de aprovocação em assembleias pelo País, ainda não foi assinado, mas a direção da Infraero já se mostrou favorável à ideia. (FG/AAN)
Lei criada há 12 anos fica no papel
Aplicação esbarra na indefinição sobre o órgão respon sável pela fiscalização
Criada para coibir qualquer ato discriminatório por funcionários ou proprietários de estabelecimentos públicos ou particulares em Campinas, e tida como um dos mecanismos de reação contra a discriminação direcionada a homossexuais na cidade, a Lei Municipal nº 9.809, de 21 de julho de 1998, não teve qualquer aplicação prática até hoje. Um dos autores da legislação, o vereador Francisco Sellin (PDT) admite que nunca teve qualquer informação de que a lei auxiliou alguém até o momento. Os outros autores são os ex-vereadores petistas Sebastião Arcanjo, o Tiãzinho, e Carlos Signorelli.
O diretor do Departamento de Proteção ao Consumidor (Procon), Anderson Gianetti, informou que, nos 12 anos de existência da lei, dez casos de homofobia chegaram até ele, mas nada pôde ser feito de fato. O órgão que consta no texto da lei como fiscalizador dos casos de homofobia, o Departamento de Proteção Especial, foi extinto em 1999. “Esse texto precisa ser alterado porque, agora, não há algo na lei que diga com clareza quem é o responsável pela fiscalização desses casos”, diz Gianetti.
Ainda segundo o diretor do Procon, a responsabilidade teria sido transferida para a Secretaria Municipal de Cidadania, Assistência e Inclusão Social. O advogado e coordenador de Direitos Humanos do Identidade - Grupo de Luta pela Diversidade Sexual, Paulo Mariante, questiona a informação. Ele aponta que existe no organograma do Procon uma Coordenadoria de Proteção Especial, setor que poderia receber as denúncias de homofobia. Outro caminho é a Lei Estadual nº 10.948. Porém, sancionada em 2001, apenas sete multas foram aplicadas até agora. (FG/AAN)
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